Resenhas  |  19.12.2017

Resenha: Anna Kariênina – Liev Tolstói

O livro Anna Kariênina, de Tolstói, é um clássico da literatura russa, mas também universal: uma obra grandiosa, excelente, e que até hoje ainda causa espanto. Sim, espanto! Não tem como negar que esse livro de 808 páginas se parece MUITO com a vida real. Os personagens são fictícios, mas não o que eles representam. As próprias palavras de Tolstói definem com clareza a excelência dessa obra: “Toda a diversidade, todo o encanto, toda a beleza da vida é feita de sombra e de luz”.

Resenha: Anna Kariênina - Liev Tolstói
FOTO: Isabela Zamboni | Resenhas à la Carte

Anna Kariênina foi publicado originalmente em formato de fascículos, antes de se tornar livro. Não é à toa que conhecemos tantos personagens e histórias diferentes que se entrelaçam, conduzindo o leitor por ambientes de imagens vívidas no contexto da Rússia czarista.

É difícil resumir uma obra tão grandiosa, mas, em seu cerne, o livro trata de personagens complexas, ambíguas e quase como se vivessem fora das páginas. Não existem heróis, nem vilões: na obra de Tolstói, conseguimos encontrar religião, política, classe social, a vida da aristocracia e, principalmente, a hipocrisia e dualidade do ser humano.

A sinopse é bem simples: Anna Kariênina, uma aristocrata casada, envolve-se em um caso extraconjugal com o conde Vrónski e experimenta as virtudes e as tristezas de um amor profundo, porém recheado de conflitos. A história começa com Anna chegando à casa do seu irmão, Stepan, que está em uma situação difícil com sua esposa – Dolly –  e Anna intervém na situação, que, de certa forma, é um reflexo do que ela mesma vai passar em breve.

No entanto, o caso amoroso da protagonista reflete na vida de muitas pessoas ao seu redor, especialmente seu marido, Aleksei Aleksándrovich. O marido de Anna é um homem frívolo, distante e contido e, mesmo em alguns momentos de suposta fragilidade e compaixão, durante toda a narrativa ele se mantém uma das personagens mais odiosas do livro.

Já Vrónski é um personagem ambíguo: ao mesmo tempo em que nutre uma paixão imensa por Anna, também sofre de tédio e vergonha por sua situação. Ele ama a mulher, mas não consegue aceitar o fato de que não consegue mais viver em sociedade. No início da história, ele assemelha-se mais a um homem libertino, conquistador e orgulhoso; mas no decorrer da narrativa, torna-se mais distante do leitor e Tolstói o mostra sob um novo olhar: um homem maduro, mas cansado de viver em uma situação complicada ao lado de Anna.

Anna Kariênina é constantemente julgada por ter deixado o marido para viver um caso extraconjugal e começa a sofrer as consequências desse ato. Separada do filho, a protagonista de Tolstói vive batalhando com seus conflitos internos: será que ela fez a escolha certa? Como conviver com tantos amores, dissabores e frustrações? O amor pelos filhos supera seu amor por Vrónski? O ciúme doentio também perpassa os pensamentos da personagem o tempo todo, levando-a a tomar decisões muito ambíguas durante toda a trama.

Além do triângulo amoroso, outros personagens importantes também compõem a trama do livro. Ao final dessa edição da Companhia das Letras, está disponível uma árvore genealógica com o nome de todos os personagens, tamanha a complexidade. Outro protagonista do livro é  Liévin, um jovem rapaz proprietário de terras, que leva uma vida simples no campo, embora seja extremamente rico. Liévin é amigo de Oblonsky (o irmão de Anna), e é apaixonado por Kitty, cunhada do mesmo.

Resenha: Anna Kariênina - Liev Tolstói
FOTO: Isabela Zamboni | Resenhas à la Carte

Confesso que as partes que envolvem o Liévin são os momentos mais cansativos do livro. Apesar de, em determinadas passagens, os diálogos serem interessantes – principalmente as conversas de Liévin com seu irmão a respeito de economia, política, filosofia e religião – na maior parte da história o personagem é enfadonho. No entanto, ele é um dos grandes destaques da obra, da mesma forma que Anna, então aguarde muitas discussões e reflexões de Liévin sobre diferentes assuntos.

Anna Kariênina não é um livro apenas sobre adultério ou relacionamentos extraconjugais: o que Tolstói realmente nos apresenta são relações familiares e seus conflitos, além das tristezas, sofrimentos e alegrias envolvendo as decisões das personagens, sejam elas egoístas, corretas ou equilibradas. O que observei durante a leitura desse livro incrível é a complexidade dos relacionamentos. A habilidade e maestria em narrar diferentes pontos de vista é o que torna Tolstói um dos grandes autores do cânone literário.

Outro aspecto bem marcante é o tom de ironia utilizado pelo autor no decorrer da história. Seu jeito de satirizar determinadas emoções e pensamentos dos personagens é tão sutil que me lembrou um pouco a britânica Jane Austen. É também importante notar que, durante as mais de 800 páginas, acompanhamos a evolução e o crescimento de cada personagem. Enquanto no comecinho eles agem de certa forma, ao final do livro são pessoas completamente diferentes e ainda mais complexas, tornando Anna Kariênina uma espécie de romance de formação de diversos personagens.

Acompanhar Anna Kariênina foi uma ótima experiência: sofri, me emocionei e ri com os personagens. É quase como se o leitor fizesse parte daquele círculo social e conhecesse aquelas pessoas. A linguagem fácil de compreender e a forma como o autor consegue trazer sensibilidade às personagens, fazem desse livro uma jornada inesquecível. Com certeza é um dos melhores livros que já li na vida!

Nota: 

banner classicos

*Última atualização em 4 de março de 2024

Anterior
Próximo
Compartilhe
Comente Aqui
0 Comentários “Resenha: Anna Kariênina – Liev Tolstói”
[fbcomments]