*Atualizado em 14 de março de 2024
Só havia lido Orgulho e Preconceito da Jane Austen lááá em 2007, e confesso que na época não gostei e penei pra terminar. Mas em Persuasão, fiz as pazes com a autora, já que percebi que, na verdade, eu é que não compreendia seu estilo e genialidade literária.
É comum associar os livros da autora a meros romances “banais” água com açúcar, mas uma segunda leitura permite uma compreensão das ironias finas nas entrelinhas, além de frases marcantes que contém uma crítica feroz à sociedade rural britânica do século XIX.
Em Persuasão, acompanhamos a protagonista Anne Elliot, filha de Sir Walter Elliot, um baronete mesquinho, esnobe e vaidoso. Anne é uma mulher inteligente, graciosa, bonita, mas ainda solteira aos 28 anos.
Quando era mais nova, foi noiva de Frederick Wentworth, um jovem inteligente e ambicioso, mas que não tinha tradições ou conexões familiares importantes. Anne foi persuadida pela família a romper o relacionamento, mas 8 anos depois, terá que lidar com a volta de Frederick e uma nova vida, longe da casa onde sempre viveu.
“Mas Anne, cujo caráter elegante e trato gentil teriam lhe garantido um lugar de destaque em qualquer grupo dotado de real discernimento, não era ninguém nem aos olhos do pai, nem aos da irmã; sua palavra nada valia, seu papel era ceder sempre – ela era apenas Anne”.
A edição que eu li tem uma apresentação bem interessante de Ricardo Lísias: um panorama que engloba tanto Persuasão como as outras obras de Austen.
No texto, ele comenta que “Assim como o cenário e as personagens, o estilo de Jane Austen não varia entre seus romances. Os textos são límpidos, redigidos de forma clara e sem sobressaltos. Às vezes, as descrições ameaçam exceder-se, mas o domínio técnico da autora, incomum e vistoso, interrompe-as antes do exagero. Normalmente ela faz isso utilizando o diálogo“.
Outra observação de Lísias que concordei e acho bastante válido ressaltar é que “não estamos diante de um livro de suspense, mas logo intuímos que há muito mais por baixo da aparente placidez desses parágrafos, construídos com graça e equilíbrio“.
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“Eram esses os sentimentos e as sensações de Elizabeth Elliot; essas as preocupações que temperavam e as agitações que animavam a mesmice e a elegância, a prosperidade e o vazio de sua vida; esses os sentimentos que davam colorido à longa e tediosa residência em uma mesma comunidade rual, e preenchiam os tempos mortos, na existência de um hábito útil fora de casa, um talento ou uma realização doméstica para ocupá-los.”
Não é fácil comentar sobre a história em si, porque o livro é composto de descrições e diálogos entre personagens. Dessa forma, a ação narrativa não é o elemento primordial neste livro.
É necessário ler com calma e paciência, porque Austen é uma autora que prioriza a sutileza e o olhar sobre as relações familiares e sociais da época. A política, ainda que apenas como eco, também está ali no romance, mesmo que não seja o foco da autora.
Ainda segundo Lísias, “[…] para ela, as implicações de um olhar terminavam na análise do preconceito social da classe burguesa rural da Inglaterra do século XVIII“.
O título Persuasão é bem interessante, porque o tempo todo encontramos essa palavra “pulando” das páginas, mostrando inúmeras situações em que os personagens precisam ou são persuadidos de alguma maneira.
Convencer e persuadir uns aos outros, é esse o elemento principal da história de Anne Elliot, Elizabeth, Sir Walter, Wentworth, e outros personagens que tornam este livro tão encantador.
Não espere uma epopéia, uma história repleta de acontecimentos ou um texto romântico. Austen é cínica, assim como sua obra, o que a torna mais elegante e sofisticada na escrita.
“Anne ficou convencida, pela expressão das duas moças, que isso era justamente o que elas não queriam, e mais uma vez admirou o tipo de necessidade que os hábitos familiares pareciam produzir de que tudo devia ser comunicado, e todas as atividades realizadas em conjunto, por mais indesejável e inconveniente que isso fosse.”
Só preciso ressaltar uma coisa: não abandone o livro! Por mais que, em alguns momentos, a história esfrie e não dê tanta vontade de continuar, a dica é prestar bastante atenção em cada frase do livro. O close reading (já comentei sobre isso aqui no blog) é essencial nas obras da escritora. Boa leitura!
Nota:
Isabela Zamboni Moschin é jornalista, especialista em Língua Portuguesa e Literatura e mestre em Mídia e Tecnologia. Adora café, livros, séries e filmes. Atualmente, trabalha como Analista de Conteúdo na Toro Investimentos