Resenhas  |  17.01.2017

Resenha: Dois Irmãos – Milton Hatoum

*Atualizado em 7 de março de 2024

Sempre ouvi falar muito bem de Dois Irmãos, do escritor brasileiro Milton Hatoum. Já tinha lido resenhas na internet, uma professora minha da Pós já havia mencionado o livro (assim como toda a história de Hatoum) e sabia que deveria ser uma obra indispensável.

E não deu outra: a partir do momento que comecei a leitura, não queria mais largar. O estilo envolvente do autor nos faz viajar pela história de uma família cheia de conflitos e dissabores. Cada personagem é importantíssimo para a trama e é construído com cautela.

Resenha: Dois Irmãos - Milton Hatoum
Foto: Isabela Zamboni/Resenhas à La Carte

Acompanhamos a história de dois gêmeos, Yaqub e Omar, que desde crianças não se bicam. Eles são de origem libanesa e vivem em Manaus com a mãe Zana, o pai Halim, a irmã Rânia e a empregada Domingas.

A trama de Dois Irmãos é intensa, mostrando com detalhes situações complexas dessa família, desde momentos de paz e tranquilidade até as piores situações. A escolha do narrador é bem interessante, já que só descobrimos quem ele é no meio da história.

Não vou contar para não estragar, mas a partir do ponto de vista desse narrador, descobrimos detalhes e características únicas desses personagens que tentam sobreviver no caos da cidade.

A narrativa de Hatoum é envolvente, descrevendo cada aspecto, nome de rua e detalhe de Manaus, além da cultura local, desde o linguajar até a culinária. O autor escreve com propriedade, revelando minúcias de uma cidade em desenvolvimento e que, entre o período da segunda Guerra até o Golpe de 64, tenta se manter com seus comerciantes locais, pescadores, turistas e outros trabalhadores. Juro que durante a leitura eu só pensava em como queria conhecer Manaus e como a cultura brasileira é rica e diversa.

Porém, ao mesmo tempo em que encontrei descrições incríveis (do jeito que mais gosto: sem excessos), a construção psicológica das personagens é fenomenal. A estrutura da narrativa também é interessante, já que o autor cita um acontecimento importante, mas faz um certo suspense e distrai o leitor, que demora algumas páginas até conseguir respostas. E quando encontramos algumas delas, é sempre um baque emocional.

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A rivalidade entre os gêmeos é o ponto alto da trama. Omar e Yaqub são muito diferentes, com personalidades opostas, e a criação dos pais interfere muito na trajetória de ambos. Em alguns momentos, eu queria jogar o livro longe e dar um MURRO na cara do Omar. O “Caçula”, como é chamado pelo narrador – pois nasceu logo após Yaqub – é insuportável: mimado, irresponsável, agressivo e ingrato.

Já Yaqub mostra traços de um homem traumatizado, deslocado do mundo, sisudo e com uma raiva profunda do irmão, que fez algo terrível com ele na infância. Sentimos essa angústia dos gêmeos em querer mostrar para a mãe (que é exageradamente protetora e possessiva) que eles podem seguir seus caminhos.

O pai, Halim, é um homem cansado, que sempre deixa claro que nunca quis ter filhos, mas sua paixão intensa por Zana, sua esposa, o levou para este caminho. Já a irmã Rânia é uma mulher forte e sensual, que optou por nunca manter um relacionamento sério, rejeitando todo e qualquer pretendente.

O sonho de Rânia era encontrar um homem como seus irmãos, por quem nutria um apreço muito forte (e até exagerado, já cheguei a achar que podia ser incestuoso).

Domingas era a empregada fiel, uma moça órfã que foi “vendida” para a família depois de viver um tempo no internato de freiras. Seus sonhos e lembranças desmoronaram após viver uma vida cansativa e de tensão constante dentro dessa casa. A história de Domingas é triste e melancólica, mas ela é de longe uma das melhores personagens do livro.

restante é um mais desprezível que o outro. O engraçado é que, geralmente, quando só tem personagem horroroso em algum livro, eu não tenho nem vontade de continuar. Mas em Dois Irmãos, mesmo com tanta gente fazendo coisas tenebrosas e agindo de forma tão animalesca, você sente uma certa empatia por todos.

Cada um é daquele jeito graças à construção de suas vidas, seus encontros e desencontros, seus traumas, medos e angústias. São pessoas tentando sobreviver e fazendo o melhor de si para manter uma vida aceitável, contudo, com seus próprios defeitos interferindo em seus caminhos.

A obra de Hatoum é recomendadíssima, um dos melhores livros que já li até hoje (assim como Enclausurado, do Ian McEwan) e merece total atenção. Se você terminar a leitura e não ficar nem um pouco balançado(a), é porque…. Não sei. Com certeza você vai adorar Dois Irmãos!

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